Ninguém é obrigado a compreender o outro ou a sentir o que os outros sentem. Na verdade, fazemos isso como uma forma de criar laços com as pessoas de quem gostamos ou que, de alguma forma, estão envolvidas conosco. É uma tentativa de estarmos ligados, de sermos solidários com a dor e o sofrimento de quem amamos.

Porém, durante o processo de adoecimento e ao longo do tratamento do câncer, percebi que muitas pessoas não estavam tão dispostas a sentir a minha dor. Era curioso, porque mandavam mensagens, mostravam-se preocupadas, ligavam e perguntavam: Como você está?

Mas será que essas pessoas realmente queriam saber? Saber com riqueza de detalhes, saber profundamente, saber ao ponto de as lágrimas gritarem mais alto que as próprias palavras?

Infelizmente, aprendi da pior maneira que não. A maioria das pessoas ou não quer realmente saber, ou não quer ter a responsabilidade de lidar com toda aquela informação desconfortável, que machuca. É como se os próprios problemas já fossem mais do que suficientes, e perguntar pelo outro fosse uma mera formalidade ou, em alguns casos, uma espécie de obrigação, um roteiro tirado de um “manual de boas práticas” para lidar com um parente enfermo.

O que mais me entristeceu foi constatar que só compreende verdadeiramente quem já esteve em uma situação parecida: quem sofreu com diagnósticos e tratamentos similares, quem teve pensamentos assustadores, enfrentou medos, crises de choro, ou quem acompanhou de muito perto alguém nesse estado — enxugando lágrimas, ouvindo palavras difíceis dos médicos. Fora isso, os outros possuem apenas uma vaga ideia da situação.

Tive essa experiência com pessoas muito próximas, dentro do meu núcleo familiar, mas que não conviviam comigo na mesma casa durante o período em que realizava os tratamentos de quimioterapia e outros procedimentos. Eu tentava contar sobre os efeitos colaterais, sobre as incapacidades que enfrentava, mas era como falar para o vazio. No final das contas, todos queriam ver as fotos sorridentes, os vídeos de superação, mas ninguém queria estar nos bastidores.

Para piorar, ainda havia aquelas pessoas que minimizavam todo o sofrimento, como se existisse um jeito “correto” de ser uma paciente oncológica, ou como se houvesse uma espécie de “câncer bom” — tudo isso pelo fato de não saberem os detalhes do que se passava comigo.

E então, como encarar tudo isso? Eu me sentia constantemente invalidada. Como não cheguei a vomitar ou ter algum desarranjo físico mais visível, era como se eu já estivesse ótima, pronta para enfrentar o mundo. Afinal, era só um tratamento, não é?

Mas não, não é “só um tratamento”. É o corpo inteiro em desajuste, lutando contra células malévolas e poderosas que insistem em vencer. É uma sensação horrível de estar sendo rejeitada pelo próprio corpo.

Sentia-me profundamente só na minha dor e quanto mais o tempo passava e as coisas voltavam ao “normal”, mas sentia a cobrança para pensar e agir como antes, apesar de muitas coisas terem mudado, não foi apenas o meu corpo que mudou, eu mudei muito, as minhas relações também mudaram.

Então tive a ideia de criar um perfil na internet e procurar por pessoas que passam ou passaram pela mesma experiência, já tinha ouvido falar sobre isso, também havia o grupo de terapia do hospital, mas eu ainda não estava preparada para encontrar face a face com outras doentes, porém a página na net resultou e para a minha felicidade, conheci outras mulheres e suas histórias, conversei no privado com algumas e senti que era ouvida e também pude perceber como a minha experiência poderia fazer sentido e ajudar outras pessoas.

Encontrei o que precisava, precisava ser acolhida, motivada por quem entendia do assunto, isso me trouxe a tranquilidade em poder lidar com a falta de tato de outras pessoas, ou com a superficialidade de tantas outras, percebi que, mais do que exigir empatia de todos, é essencial buscar conexão com aqueles que realmente compreendem e têm algo a oferecer — isso transforma a forma como enfrentamos nossas lutas.

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