O mito do herói baseado no Livro O Homem e Seus Símbolos – Carl Jung

O mito do herói, presente em diversas culturas ao longo da história, nos fascina com suas narrativas de coragem, superação e triunfo sobre o mal. Mas o que torna essas histórias tão atemporais e universais? Neste texto, exploraremos a evolução do mito do herói, com base no livro o Homem e Seus Símbolos de Carl Jung desde as antigas mitologias até a cultura popular contemporânea. 

É possível ver como esse arquétipo influencia nossa psicologia, molda nossas identidades e até mesmo impacta o mundo. Através de uma análise detalhada de diferentes culturas e teorias, buscaremos compreender a importância do herói em nossas vidas e a forma como ele continua a inspirar e transformar a sociedade.

 O mito do herói esteve presente em rituais de povos antigos, na mitologia clássica grega – sendo Hércules um dos seus heróis mais famosos e na idade média, nos nossos sonhos contemporâneos.

Segundo Jung, o desenvolvimento do ego é uma atribuição essencial do mito heróico no indivíduo sendo a consciência do ego — o conhecimento de suas próprias forças e fraquezas — de maneira a deixá-lo preparado para as difíceis tarefas que a vida lhe há de impor.

Fortalecer o “eu” interior, permite com que a pessoa seja mais consciente de si mesma e do mundo ao seu redor.

Sendo assim, uma vez passado o teste inicial e entrando o indivíduo na fase de maturidade da sua vida, o mito do herói perde a relevância. A morte simbólica do herói assinala, por assim dizer, a conquista daquela maturidade.  

Desbravar o mito do Herói

O Dr. Radin constatou ao estudar os índios norte-americanos, os Winnebagos quatro ciclos distintos na evolução do mito do herói: ciclo Trickster, ciclo Hare, ciclo Red Horn e ciclo Twin. (pg. 112)

A história do mito dos Winnebagos, serve de fundamento tanto para os mitos históricos quanto para os sonhos heróicos do homem contemporâneo.

Trickster : Corresponde ao primeiro período de vida, o mais primitivo. Trickster é um personagem dominado por seus apetites; tem a mentalidade de uma criança.

O personagem seguinte é Hare (a Lebre) o fundador da cultura: o transformador, é um personagem que se torna mais civilizado, corrigindo os impulsos infantis e instintivos encontrados no ciclo de Trickster. 

Red Horn, o terceiro herói desta série. Atende aos requisitos do herói arquetípico, vencendo difíceis provas em corridas e em batalhas.

Com Red Horn chegamos ao mundo do homem apesar de ser um mundo arcaico, no qual são imprescindíveis poderes sobre-humanos ou deuses tutelares para garantir a vitória do indivíduo sobre as forças do mal que o perseguem.

“O ego, porém, entra em conflito com a sombra naquilo a que o Dr. Jung chamou a ”batalha pela libertação”. Na luta travada pelo homem primitivo para alcançar a consciência, este conflito se exprime pela disputa entre o herói arquetípico e os poderes cósmicos do mal, personificado por dragões e outros monstros. No decorrer do desenvolvimento da consciência individual, a figura do herói é o meio simbólico através do qual o ego emergente vence a inércia do inconsciente, liberando o homem amadurecido” (pg.118)

“A batalha entre o herói e o dragão é a forma mais atuante deste mito e mostra claramente o tema arquetípico do triunfo do ego sobre as tendências regressivas. Para a maioria das pessoas o lado escuro ou negativo de sua personalidade permanece inconsciente. O herói, ao contrário, precisa convencer-se de que a sombra existe e que dela pode retirar sua força.” (pg.120)

“Para que o ego triunfe precisa antes subjugar e assimilar a sombra.” (pg.120)

No último ciclo, o dos Twins suscita uma questão vital: por quanto tempo podem os seres humanos alcançar sucesso sem caírem vítimas de seu próprio orgulho ou, em termos mitológicos, da inveja dos deuses? 

Por que Twins? Nestas duas crianças estão representados os dois lados da natureza humana. Um deles, Flesh, é conciliador, brando e sem iniciativas; o outro, Stump, é dinâmico e rebelde.

Para Jung, uma das figuras representaria o introvertido, cuja força principal encontra-se na reflexão, e outra o extrovertido, um homem de ação capaz de realizar grandes feitos, tanto na figura de 2 ou de 1 – torna-se invencível.

“Na história dos Winnebagos os próprios Twins ficaram tão assustados com sua força incontrolável que concordaram em viver em estado de repouso permanente, permitindo aos dois aspectos contraditórios da natureza humana reencontrarem, assim, seu equilíbrio”. (pg. 113)

É importante ressaltar que embora os elementos arquetípicos sejam universais, cada sonho é um processo particular individual, e a forma definida que toma é determinada pelas condições do sonhador. O inconsciente utiliza o material arquetípico e modifica a sua forma de acordo com as necessidades de quem sonha.

Quando e por que sonhamos com símbolos heróicos?

“Como regra geral, pode-se dizer que a necessidade de símbolos heróicos surge quando o ego necessita fortificar-se — isto é, quando o consciente requer ajuda para alguma tarefa que não pode executar só ou sem uma aproximação das fontes de energia do inconsciente.”(pg,123)

Atualmente, a teoria dos Arquétipos é muito utilizada na indústria cinematográfica, literatura, no marketing da comunicação das marcas, com o destaque para 12 arquétipos em específico, sendo um deles o Arquétipo do Herói, muito explorado inclusive pelas marcas na busca pela humanização e uma comunicação mais eficaz com o seu público. 

Em um artigo intitulado Teoria dos arquétipos e humanização das marcas de 2023 de Catarina Salgado, a autora explica como várias empresas com marcas conhecidas no mercado, utilizam qualidades de determinados arquétipos em sua comunicação, estes arquétipos representam os valores, princípios, a visão, a missão da marca e atuam de forma a tornar coerente a relação da mesma com os seus colaboradores e com os seus consumidores.

O arquétipo posiciona a marca no imaginário do consumidor, como no exemplo da Nike que claramente utiliza o arquétipo do “herói” na sua comunicação quando enfatiza, a coragem, a determinação e o espírito desportivo e apresenta atletas reais que superaram desafios e alcançaram objetivos e que servem de inspiração para os seus consumidores.

O próprio símbolo do logo representa uma das asas da deusa grega Nike, que personifica a força, a velocidade e a vitória. 

Na vida pessoal

O mito do herói, marcado por provações, crescimento e triunfo, oferece um modelo inspirador que motiva e impulsiona as pessoas a buscarem seu potencial máximo.

Ao se identificar com um herói, o indivíduo pode encontrar força e coragem para enfrentar suas próprias batalhas. A figura do herói serve como um arquétipo, representando qualidades como determinação, resiliência e perseverança. Ao internalizar essas qualidades, as pessoas se sentem mais capacitadas a superar obstáculos e alcançar seus objetivos.

Um estudo de Benjamin A Rogers, 2023 em uma revisão de oito estudos, forneceu evidências iniciais de que narrativas culturais duradouras como a Jornada do Herói refletem vidas significativas e podem ajudar a criá-las, ou seja a exposição a narrativas heróicas pode aumentar a autoeficácia e a motivação e resiliência em indivíduos. Ao se conectar com a jornada do herói, as pessoas podem encontrar um sentido mais profundo para suas próprias vidas, sentindo-se parte de algo maior.

Rogers, B. A., Chicas, H., Kelly, J. M., Kubin, E., Christian, M. S., Kachanoff, F. J., Berger, J., Puryear, C., McAdams, D. P., & Gray, K. (2023). Seeing your life story as a Hero’s Journey increases meaning in life. Journal of personality and social psychology, 125(4), 752–778. https://doi.org/10.1037/pspa0000341

Ações:
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.