Ela vem de uma longa caminhada. As mãos estão vazias, os pés descalços. Sente-se sem energia, sem vida, sem afetos.

Teve que lutar contra um inimigo oculto, sorrateiro, que insistia em crescer dentro dela. Esse inimigo queria devorar sua carne, multiplicava-se como um parasita. Era feito da mesma substância, da mesma massa…

Uma luta contra o próprio corpo, que teima em se destruir. Cada célula malformada que se replica aumenta a letalidade e a potência desse invasor. E, nessa batalha feroz entre vida e morte, quando o veneno é a única forma de combatê-lo, perde-se muito pelo caminho.

Perde-se os pelos, e com eles a autoestima. Perde-se o ânimo, e com ele a vivacidade. Perde-se a fome, a sede, e até mesmo um pouco das faculdades mentais. As perdas são incontáveis.

No meio de tantas idas e vindas a lugares não muito agradáveis – dentro e fora do corpo – sentia-se esvaziada.

Por isso, qualquer palavra a levava às lágrimas. Qualquer toque era como um oásis. Qualquer possibilidade de normalidade – uma conversa fiada, uma leitura divertida – era como encontrar o pote de ouro no fim do arco-íris. Era uma baforada de esperança.

Por um momento, a cabeça podia descansar, distraída pelas pequenas coisas do cotidiano. E, naquele instante, sentia-se gente, humanizada, e não mais “a paciente”, “a doente”, “aquela posta de lado”.

A vulnerabilidade emocional é real quando enfrentamos situações graves na vida. E, às vezes, aquele que oferece o mínimo – um gesto, uma palavra, um toque – pode ser alçado ao status de salvador. Nesses momentos, não há muitos critérios. Quando estamos por baixo, precisamos de pouco.

Mas a maior armadilha é nos tornarmos reféns desse pouco e acreditarmos que aquilo é mais do que suficiente.

Nesses casos, algumas pessoas de caráter duvidoso podem se aproveitar da situação. Nem sempre para algo material. Às vezes, é apenas para inflar o próprio ego ou satisfazer seu orgulho.

Estar em uma situação de vulnerabilidade emocional pode nos levar a tomar decisões impulsivas ou confiar em quem não merece, apenas pela necessidade de apoio. É importante lembrar que, nesses momentos, precisamos priorizar o autocuidado e buscar ajuda em fontes confiáveis, como amigos próximos, familiares ou profissionais de saúde mental. Reconhecer que estamos vulneráveis não é sinal de fraqueza, mas um passo crucial para superar esse período.

Infelizmente, levei muito tempo para compreender o que estava acontecendo. Mantinha uma amizade que, naquele momento de tratamentos difíceis, fazia com que eu me sentisse viva, pensante e produtiva – tudo o que eu mais queria e necessitava. No entanto, embora essa relação parecesse positiva em muitos aspectos, ela também tinha um custo alto.

Foi necessário ignorar várias pistas que indicavam que essa pessoa não era confiável e provavelmente estava em busca de aprovação e validação. Hoje percebo que fui, talvez, o disfarce perfeito para alguém que queria construir uma imagem de “pessoa que ajuda os outros”. Afinal, ser próxima de uma mulher em tratamento de câncer de mama, que ainda conseguia se envolver em vários projetos, parecia um excelente cartão de visitas para sua narrativa pessoal.

Felizmente, estava cercada de amigos sinceros que me ajudaram a encarar a realidade daquela “amizade” e me apoiaram na busca por compreender o que se passava comigo. Com o tempo e algumas sessões de terapia, percebi que devo investir na minha autoestima e que, mesmo em momentos de fragilidade, não é necessário ficar à mercê de ninguém.

 

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